sábado, 29 de setembro de 2012

Arteira, faceira e sapeca


Um suspiro mais forte que invade o silêncio tranquilo da minha leitura. O olhar perdido em pensamentos que viaja logo após o segundo longo barulho, de um suspiro um pouco mais profundo. O pobre livro que me olha pelas orelhas bem tratadas, verificando que já não estou mais ali. Pulei das linhas amigas para pequenas lembranças/sonhos. Sorri.

Cada pequeno fio loirinho se levantou para espiar o que os olhos brilhantes desejavam v(t)er. Um friozinho gostoso percorreu a coluna judiada pelos anos de ginástica. O calor corou as bochechas sem que percebesse. E o sorriso agora virava risada arteira, de menina sapeca.

Fechei os olhos de levinho imaginando o que queria ali, e o livro escorregou das mãos bobas que já não pretendiam segurá-lo. Os lábios entreabertos agora sorriam para o alguém do delírio. Ri sem graça, pensando em palavrinhas sussurradas ao pé do ouvido. As mãos agora passavam suaves pela pele, tentando acalmar os fios mais curiosos que insistiam em se arrepiar.

Brotavam gotinhas de saliva acumuladas em rios de desejo. E os olhos bem fechados escondiam pupilas agitadas e sem rumo. Tão pequena, como me cabe tanto desejo? Pensava comigo sonhando seus beijos. Recuperei na memória a sensação maravilhosa de lábios quentes contra os meus, estremeci. E o frio lá fora parecia alívio para aquilo que queimava em mim.

Vontade que invade sem pedir permissão ou licença, sem saber da hora, do dia ou do ano, sabendo apenas do momento. Vontade com gosto, com cheiro, endereço e nome certo. Vontade faceira.  



quarta-feira, 26 de setembro de 2012

"Vai ser sempre assim?"


A aula acabou mais cedo, e saímos da sala conversando, ali no corredor em frente aos escaninhos. Fui caminhando com os meninos, determinada a descer de elevador, hoje não me arrisquei a ir pela escada. Enquanto olhava a porta entreaberta da sala em frente, onde amigos faziam algum tipo de trabalho, escutei o Luciano dizer baixinho "Vai ser sempre assim?". 

Me virei em um impulso de perguntar "assim como?" e ao mesmo tempo respondendo a minha própria pergunta com um intenso "assim", que englobava tudo e todos nesse tempo e espaço. Em pouco tempo percebi, assim como o Thiago, que também se perguntava a que se referia o Luciano, que a pergunta nada mais questionava do que a metodologia de aula, com trabalhos em grupo.

Mas isso não bastava, agora que ela havia sido perguntada, ali no aberto espaço do corredor cercado de escaninhos, e eu repetia os termos na exata ordem que os havia escutado: "vai ser sempre assim?". Aquilo se tornou de tal profundidade no momento, que cheguei a pensar na hipótese desesperadora do assim que poderia se perpetuar, o meu "assim" extremamente desorganizado, corrido, afobado, lotado, confuso, um "assim" de angústia quase existencial.

Agora já viajava em Sartre e na responsabilidade humana sobre suas ações e destinos, e assim, meu "assim" não seria sempre...assim. Bastava que mudasse o status quo e redefinisse os rumos do trem. E a aula recém acabada retomava suas linhas de quadro branco (acho que ainda sinto falta do giz, ou não? não sei): o ser humano não pode ser totalmente conhecido e definido, ele é capaz de mudar, se redefinir, mas nunca de se conhecer ou conhecer o outro em sua mais completa complexidade.

"Vai ser sempre assim?" - Se infinitas possibilidades se estendem diante do painel futuro, não seria sempre assim, mas se as possibilidades são tantas, incluiria a constância, e aí sim, talvez seja sempre assim... Seremos sempre amigos? Seremos serenos, amenos, angustiados? Seremos assim como somos no quadro hoje pintado? Serei arteira e terrível a vida inteira?

Será que vai sempre doer o que me dói hoje? Será que tudo que doeu ainda dói, e o que não dói mais na verdade nunca realmente doeu? Será que os minutos vão seguir passando nessa marcha quase insuportável da minha espera por algo mais? Será que sempre vou sentir que deveria estar fazendo alguma coisa que não sei bem o que é? Será que serei sempre essa boba que se entrega de braços abertos e coração na mão, enrolado num laço de presente? Será que vai ser sempre tão difícil dizer "eu te amo"? Será que serei sempre assim carente?

Será que viveremos sempre correndo atrás de uma borboleta impossível de alcançar? Será que a cada degrau que subirmos vamos mirar outros tantos? Em uma escadaria infinita de ambição? Ou será que vamos sempre querer outros lances de escada simplesmente por não ser o fim da jornada? Vai ser sempre assim tão difícil dizer o que sinto? Vai ser sempre assim tão difícil viver? Vai ser sempre assim a saudade?

Vai ser sempre assim tão gostoso passar minhas tardes entre pessoas queridas? Vai ser sempre assim a alegria de escutar alguém tocar? Vai ser sempre assim o doce menino de tomar sorvete no domingo? Vai ser sempre assim sorrir ao te ver gargalhar? Vai ser sempre assim a vontade de te ver? Vai ser sempre assim sonhar com você? Vai ser sempre assim acordar depois de sonhar?

Vai ser sempre assim?




segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Escadaria


Senti uma pontada
O ar faltar
Subo a escada
Tento respirar

Desmonto na cadeira
Pálida e suando
A dor é certeira
Penso bufando

"Ainda tão nova"
Vão todos dizer
"Deus sabe a hora"
"É preciso entender"

Olho nervosa
O subir e descer
Visão embaçada
A escurecer

Desmaiei assustada
Chamando você
Acordei descansada
E sem saber

Se na hora do medo
Te amei sem querer

sábado, 22 de setembro de 2012

Sexta feira


Corre corre ponteirinho
Corre rápido na sexta a noite
Mas só até a aula acabar
Calma calma agora chega
Pode ir com lentidão
Já saí, já posso ir
Descansar o coração




quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Mais (-) Valia


Mais valia um sorriso

De menino na escola
Mais valia a saúde
De quem espera na fila
Mais valia estar viva
Do que uma vida mal vivida
Mais valia a educação
Do que campanhas de eleição
Mais valia a alegria
Do que a quase escravidão
Mais valia ser feliz
Do que ser gente importante
Mais valia viver bem
Que a perseguição constante
De sonhos de pura ambição
Mais valiam os meus dias
Que nunca voltarão
Mais valia simples tarde
Sem gritos do patrão
Mais valia tudo isso
Que a mais-valia exploração



segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Primeiro dia


Dormi cedo, para acordar bem disposta, coloquei na mochila, ainda na noite anterior, a lapiseira azul, no estojo roxo, junto com o resto do material (além da lapiseira e da borracha, só uso mesmo a caneta bic azul... mas levo o resto por precaução), acrescentei os cadernos novos, com folhas do jeito que gosto, limpas, brancas, linhas finas sem desenhos. Adoro volta às aulas, os planos são tão bons, cheios de esperança e responsabilidade, tantas oportunidades! E semestre passado foi tão proveitoso que só espero muita diversão! 

Comecei bem, até estudei no fim da tarde, e depois bati uma pratada de macarrão... que o estudo fique firme e o regime volte rápido, antes que seja em vão...

Beijinhos!

sábado, 15 de setembro de 2012

A caminhada

Se vivo pensando
Em quem veio e se foi
Onde ficam os vivos
E o viver minha vida?

Se a morte me acompanha
Sem deixar que a ignore
Vejo mais derrotas que vitórias?

Se o olhar se fixa
No fim da última curva
Quem me guia
No resto do caminho?

Há de haver vida
Nos olhos de menina
Na longa jornada que trilha
E não há de trilhar sozinha

Caminham juntos amigos
Companheiros unidos
Por uma caminhada 
Inesquecível


quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Coragem


Onde você está? Justo agora que preciso que fique ao meu lado... como pode ficar aí do outro lado desse rio, rindo de quem precisa de você? Não, me sugerir soluções distantes e que não te exigem nada... não me satisfaz. Também não adianta dizer que já vem e demorar uma eternidade... sou tão pouco importante, se é que se pode sê-lo, assim? E pensar que pensei que nunca iria me abandonar... Aliás, todos me diziam e garantiam isso. 

Volte logo aqui ! Acreditei naquela promessa ! Lembre-se de que carrego no nome a crença na verdade, e acredito com facilidade na sinceridade que às vezes me engana... Como me dói cada vez que olho o horizonte e me lembro de que em algum momento contei com você ! E quando dizia que podia contar comigo, eu nunca menti ! Pegue um par de remos agora mesmo ! Volte rápido !!! e não use a correnteza como desculpa para não vir, é exatamente porque ela está me arrastando que preciso da sua mão no meu ombro.

Coragem que tantos repetem incessantemente que tenho, não me abandone nesse momento...


terça-feira, 11 de setembro de 2012

Anjo da guarda


Amorzinho, vou-me indo
Que amanhã é quase hoje
Vou dormir devagarinho
Sonhos bons como os que ouve
Vou dormir com os anjinhos
Que me protegem essa noite
Vou dormir com carneirinhos
Sem contá-los
Sem afoite



domingo, 9 de setembro de 2012

De preto e branco


Seguiu caminho
Era o único jeito
Flor com espinho
Sufocou o desejo

Seguiu sozinho
Sua dor no peito
Sem amor no carinho
Pensando no beijo

Tatuou sob da pele
De preto e branco
O que não esquece
O que não virou pranto

Foi caminhando
Com passos leves
Continuando
A lista de "deves"

Deve falar
Deve esquecer
Deve amar
Saber viver

Devo sorrir
Devo chorar
Saber mentir
Não me apaixonar

Devo omitir
Devo gritar
Devo dormir
Devo acordar

Mas nunca pensando
No que penso sempre
Nunca sonhando
O que se foi de repente

Pensar na dor
A faz melhorar?
Ou o sofredor
Só nela pode pensar?



sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Adeus


Eu vou embora, levando pouca bagagem. Vou embora levando minha mochila de escola, com um pijama, uma escova de dente e um filtro solar. Eu vou embora e vou tentar não olhar para trás. Vou embora sem enxugar as lágrimas que escorrem. Eu vou embora porque preciso me salvar. Vou embora porque não sei me proteger. Eu vou embora antes que seja tarde demais. Vou embora porque já me despedacei. Eu vou mudar de rota o mais rápido possível, vou escolher outro caminho, pois esse destino... não me agrada. Vou embora porque dói ser esquecida, dói ser vírgula na vida de quem na minha... fora capítulos inteiros de um romance sem final. Eu vou embora porque não quero assumir que esse fim seja um fim ainda maior, o quero apenas como início do recomeço. Vou embora, vou porque eu mereço. Mereço ser feliz. Eu vou correndo, tropeçando, rindo de tristeza, vou antes que troque meu nome de novo, vou antes que se esqueça de avisar que não vem, vou antes que adormeça sem me dar boa noite, vou antes que amanheça sem me beijar. Eu vou embora antes que perca as boas memórias. Vou embora antes de matar nossa história. Vou embora porque o amor não cabe mais em mim, e por isso deve partir. Adeus.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Quadro


Compulsivamente encaro o quadro
Procuro onde foi que deu errado
Tento me limitar à moldura
Tento, mas a tarefa é dura

Procuro pinceladas em outra direção
Procuro, mas me cega o coração
Tudo que vivi foi ilusão?
Havia sentimento, emoção !?

Pintei apenas brancas margaridas
Nenhuma das dores sofridas
Pintei versos singelos de amor
Nunca o coração sofredor

Agora a tela não era ensolarada
Via ali o escuro, o nada
Um tapa áspero de realidade
Vi que era feia, na verdade


terça-feira, 4 de setembro de 2012


Tão só que não se escuta
Murmúrio, barulho algum
Tão só que não se vê
Sorrisos, nenhum

Sozinha na multidão
Risos todos em vão
Companhia da solidão
Apunhalado coração

Silêncio nesse vazio
Cheio de gente passando
Um olhar perdido
Lágrima queimando

É gente tentando entender
É gente querendo esquecer
Tem gente que manda crescer
Tem gente pagando pra ver

É silêncio e vazio nos dias
É escuro sem sono de noite
É alívio nas piscinas
E em pesadelos açoite

É dor que se esconde ligeira
Sem dizer de onde vem
Dor que volta certeira
Só de pensar em alguém

É estar sozinha com todos
Detestar minha própria companhia
É abraçar a causa dos loucos
E assim ser enfim esquecida

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Condição



Se um só fio
Se arrepiou
Se sentiu frio
Mas não congelou

Se sabia o caminho
Se desviou
Se queria carinho
Mas não achou

Se sentiu sozinho
Se perdoou
Se fez menino
Mas não chorou

Se tudo isso
Se acabou
Se fez sentido
O amor ficou

domingo, 2 de setembro de 2012

Cartas no jardim

* que nunca serão entregues*

Setembro é recomeço
Início e desapego
Matar algum desejo
Ter qualquer sossego

Setembro é uma brisa
Leve à nossa vida
Moça ou menina
Certeza de alegria

Setembro é mês amado
Amor tão mal tratado
Cresceu no jardim o mato
Por culpa do descaso

Setembro tão certeiro
Enviaste mensageiro
Errou o jardineiro
Cartas no canteiro

Carta de Setembro
Que nunca será entregue
Carta que bem me lembro
Trazia o sonho que persegue